Por Erika Araújo
O mercado público foi o primeiro lugar pelo qual passamos na manhã do nosso segundo dia em Lisboa. Mas uma vez, foi inevitável a comparação com São Paulo. Achamos o nosso muito mais bonito. O deles é mais como um galpão grande, sem muito fru-fru, mas não deixa de ter o seu charme. No andar de baixo, frutas, verduras, peixes, temperos, artesanato e um corredor todo só para flores. No segundo, uma livraria onde os livros estão dispostos em bancadas ao invés de prateleiras, restaurante e um corredor com fotos que contam a história do mercado, desde a época em que o comércio era feito na rua até a construção da edificação.
O Monumento aos Descobrimentos foi o nosso próximo destino. Para chegar até lá, pegamos um trem de superfície na frente do mercado e descemos quase na metade do caminho. O resto do trajeto fizemos a pé, margeando o rio Tejo ao lado de outros turistas, ciclistas e algumas pessoas se exercitando. Do outro lado do rio, vimos a estátua do Cristo Lisboeta, inspirado no nosso Cristo Redentor, que agradou ao Cardeal Patriarca de Lisboa, durante sua visita ao Rio de Janeiro, em 1934. A construção do monumento lisboeta foi iniciada em 1949, depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em cumprimento ao voto feito pelo Episcopado português, que se comprometeu a erguê-lo caso Portugal ficasse de fora do conflito. Do mesmo ponto de observação, a Ponte 25 de Abril, que liga Lisboa à Almada, nos chamou a atenção pela semelhança com a velha Hercílio Luz, de Florianópolis. Só que as proporções são muito maiores. Além de automóveis, a ponte portuguesa foi projetada, em 1960, para suportar também o tráfego de trens – inicialmente batizada Ponte Salazar, em homenagem ao ditador que comandou o País de 1932 a 1968, a ponte recebeu o nome atual após a Revolução dos Cravos, que derrubou o antigo regime militar, no dia 25 de Abril de 1974.
Enfim, chegamos ao monumento de mais de 50 metros de altura, em forma de caravela, que carrega os heróis dos descobrimentos portugueses. No interior, com quatro andares, são apresentados filmes e exposições sobre os descobrimentos de Portugal. O último andar serve como mirante e tem vista para o Rio Tejo. Não subimos, achamos caro os 5 euros cobrados pela visita. A fome também estava apertando e ainda passaríamos pela Torre de Belém antes de pararmos para o almoço.
A chegada à Torre de Belém foi decepcionante. Demos de cara com uma decoração mais que de mau gosto. Dezenas de bolas infláveis numa nada discreta cor de laranja, penduradas do lado de fora. Não interessa em comemoração a que. A decoração, para nós, foi o equivalente a um ato vandalismo. Pagamos só 1,5 euros para entrar, graças ao desconto de 50% para menores de 26 anos e a carteira de jornalista do Dubes. O passeio nos deu uma idéia de como funcionava a fortificação, inaugurada em 1520 e usada originalmente como peça central do sistema de defesa da barra do rio Tejo, de onde partiam as naus em direção as Índias e ao Novo Mundo. A subida ao topo, através de uma escada estreita em caracol, de pedra, cansa os fisicamente menos preparados. As paradas em cada andar, para ler um pouco sobre a história do lugar e para que foi usado cada pavimento, valem à pena.
A parada para o almoço foi adiada depois que passamos em frente ao Centro Cultural de Belém, onde funciona o Museu Colecção Berardo, de arte moderna e contemporânea. O prédio nos chamou a atenção pelas proporções e decidimos entrar. Logo de cara, vimos uma exposição do fotógrafo, pintor e escritor haitiano Gérald Bloncourt, chamada “Por uma vida melhor”, sobre a imigração portuguesa para a França, nas décadas de 1950 e 1960. Expulso de seu país de origem e exilado na Europa, Bloncourt colaborou com publicações da imprensa operária e progressista de Paris, como La Vie ouvrièri e L’Humanité, e cobriu a movimentação de quase um milhão de portugueses que deixaram Portugal, muitos deles a pé, em busca de uma vida melhor na periferia de grandes cidades francesas, nas duas décadas citadas. As casas de lata, onde as famílias se instalavam; as crianças com caras sujas e sofridas; e mulheres carregando latas de água são algumas das imagens que o fotógrafo capturou ao acompanhar o trajeto dessas famílias.
Visitamos depois seções do acervo do museu, que cobre toda sorte de movimentos artísticos do século passado, da picareta “Action Painting” aos populares cubismo, surrealismo e pop art. Compramos postais na loja do museu e seguimos para a Rua de Belém, bem próxima, onde estão a Confeitaria de Belém, famosa pelo tradicional e patenteado Pastel de Belém, e restaurantes pequenos que satisfazem por preços honestos. Um bom prato feito, com chope, sai por 6,50 euros. De barriga cheia e um pouco mais descansados enfrentamos a fila de quase meia hora para provar a receita original do tal pastel. Fresquinho e salpicado com açúcar e canela. Sensacional!
O pouco tempo que passaríamos em Lisboa nos obrigava a aproveitar cada hora na cidade. Passamos ainda no Mosteiro dos Jerônimos, que já estava fechado, mas ainda deu pra conhecer a catedral que pertence a ele.
Já de volta ao centro, na Praça do Comércio, sentamos para tomar um café no Martinho da Arcada, famoso por ter tido como freguês o escritor Fernando Pessoa, e fomos para o albergue, já no início da noite.
No dia seguinte pulamos da cama bem cedo para aproveitar o pouco tempo que tínhamos antes do check-out no albergue, ao meio dia. Andamos pelo Bairro Alto, visitamos o topo do Elevador de Santa Justa – que se parece muito com o Elevador Lacerda, de Salvador – e tentamos provar o vinho do porto no Solar do Vinho do Porto, mas acho que os portugueses não têm muito o hábito de beber antes das onze na manhã, horário em que passamos por lá e demos com a cara na porta de vidro fechada. Sem tempo para esperar, voltamos para pegar nossas coisas e ir para o aeroporto esperar o vôo para Madrid.